terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Devia ter...

“...o remorso crônico é um sentimento dos mais indesejáveis. Se uma pessoa procedeu mal, arrependa-se, faça as reparações que puder e trate de comportar-se melhor na próxima vez. Não deve, de modo algum, pôr-se a remoer suas más ações. Espojar-se na lama não é a melhor maneira de ficar limpo.”


Em curtas palavras: “Não adianta chorar pelo leite derramado “. A não ser que suas lágrimas absorvam o leite e ainda representem o arrependimento, e o arrependimento se arrependa de ter sido arrependido, deixando futuras novas reparações, de novas situações, sem sentido.

 

O primeiro trecho é parte do prefácio de Admirável Mundo Novo. Nele, Huxley disserta sobre as mudanças, sobre como encara o livro que ele próprio escreveu após alguns anos. Imagine, sua obra é consagrada, você é conhecido e identificado não mais como a si mesmo, mas como o autor de x coisa, sendo que com o tempo você nem concorda mais com aquilo.

 

“...defeitos são consideráveis; mas, para corrigi-los, eu teria de reescrever o livro- e, ao reescrevê-lo, como uma outra pessoa, mais velha, provavelmente eliminaria não apenas as falhas da narrativa, mas também os méritos que pudesse ter tido originalmente.”

 

Corrigir o passado seria como um livro interminável.  O nome do personagem é Harry. Ah não, prefiro Jack agora. Pensando bem, talvez Bento pudesse ser melhor..Nossa vida é um imenso livro em mudanças. Ora apanhados de contos, ora capítulos que não terminam com suspense, ora um romance sem romantismo dentro de um romance quase documentário.

Não só livros, a arte em si, filmes, quadros, poemas curtos, são a essência daquele pensamento, daquele momento de imaginação. Algumas essências são mais marcantes. Algumas melhor planejadas. Algumas, essências que seriam melhor não terem sido. Outras são essências mais essenciais.

E, dentro do livro mutante da vida, podemos criar vários pensamentos, várias essências. A essência é imutável, eu sei. Melhor dizendo, a essência do pensamento é imutável, o que não significa que não mudemos de pensamento. É claro, não mudamos simplesmente do nada. Palavras, acontecimentos, tudo influi em algo. Mudar de pensamento é vida. Mudar de pensamento apenas para se beneficiar em certa ocasião, fingir concordar com o que não pensa de fato é hipocrisia, falsidade, falta de coerência.

Mudar de pensamento não é abandonar o passado. O passado define o futuro, e o presente é o que acontece para as definições. Eu respondo pelo meu passado, para que eu possa primeiro abandoná-lo, realizar essa “re-educação”(esse, definitivamente, não é o termo. A educação é constante,aprendemos e desaprendemos, apenas precisamos de oportunidades e métodos que possibilitem nós mesmos evitarmos novas punições, ou melhor, que a punição não seja apenas um modo de justificar, mas sim de tornar a mudança possível). E cabe só a nós “abandonarmos” o passado. A sociedade também deve não nos pré-conceituar pelo o que já nem somos mais.

Eu não desejo tanto a fama. Muito menos repentina, por um único acontecimento.  Ok, com certeza gostaria de fazer algo que repercutisse. Mas, teria quer algo que eu tivesse gostado muito de fazer.

Imagine passarem anos e você continuar a fazendo seja lá o que, porém, continuar a ser lembrado por uma só coisa.  Quem é você? Sou o ator daquele filme que nem gosto mais. O autor da música que nem ouço mais. A sub-celebridade que teve 5 minutos de fama, mas nenhum momento em que realmente se importassem com minha vida.

Claro que tudo isso resume o que fiz, o que fui. Que tudo isso faz as pessoas se lembrarem de mim.  Que, quando eu partir,  faça os menos próximos se lembrarem de mim pelos meus pais, pelas minhas características físicas., por algum momento específico. Entretanto, que os mais próximos se lembrem de momentos grandes ou pequenos. Que guardem algum com mais intensidade, mas não me definam por profissão, passado distante ou presente delirante.  Que se lembrem de mim mesmo como mim mesmo, com uma definição única, não por palavras que agrupem , sem identidade.

E, principalmente, que eu possa escrever no meu epitáfio:

“Fui eu mesmo. Isso foi bom para mim. Espero que bom para o mundo.”